19 junho 2007

A uma amiga




Depois de muito tempo sem escrever, hoje venho aproveitar meu pequeno espaço para prestar uma homenagem a uma amiga muito especial, que há algum tempo espera para continuar sua jornada em nossas vidas. Como muitos sabem tenho uma amiga que está na fila de transplante por um novo coração. A luta não está sendo fácil, mas a Ana tem sido surpreendentemente forte, e é por essa força que presto essa homenagem.
O texto a seguir foi escrito por ela, para que pudessemos sentir um pouco daquilo que tem passado, além de nos fazer ver que não devemos perder as esperanças...nunca!





O ato de doar órgãos é um ato de amor ao próximo


“Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente na angústia.”(Salmo 45)

Dificuldades e provações estão presentes na vida de cada um de nós. São superadas com menos sofrimento quando entregamos nossas vidas nas mãos de Deus e enfrentamos os obstáculos confiantes de que Ele está ao nosso lado.

Há seis meses estou na lista de espera por um transplante de coração. Desde criança sofro com problemas cardíacos. Apesar de todas as limitações impostas pela doença, tive uma infância e adolescência felizes e um promissor início da minha vida adulta.

Recebi como presente uma família abençoada, amigos e colegas sempre presentes e dispostos a me ajudar constantemente, nas mais diversas situações.

Embora com todos os tratamentos e cuidados médicos, sempre seguidos, a doença cardíaca evoluiu, e agora, aos 26 anos, dependo do transplante para retornar à minha vida de onde ela parou.

Quando escutei a palavra “transplante” pela primeira vez, meu desespero e angústia foram tamanhos, que eu chorava em todas as consultas médicas. Inúmeras vezes chorei em silêncio, pedindo a Deus que curasse meu coração. A idéia de trocar meu coração era apavorante. Como iria viver com um órgão tão vital que não era meu? E por quanto tempo eu ficaria na fila de espera e em que estado?

Os medos eram enormes, a falta de informação sobre o assunto também, e, admito, questionei minha fé. Entretanto, nos momentos de angústia e dúvidas, recorri à palavra de Deus, e sempre me sentia aliviada e confiante no futuro.

Passei a compreender que Deus é Pai, e Ele quer o melhor para mim, para você, para cada um de nós, pois somos seus filhos e o amor dele está acima de todas as dores e sofrimentos aos quais somos submetidos. Assim como meus pais querem me poupar de qualquer dor, o amor do Pai Eterno é incondicional, e Ele sabe o que é melhor para seus filhos.

Entreguei meu coração a Deus, e em dado momento Ele decidiu que eu e todos ao meu redor estávamos preparados para enfrentar o transplante.

O processo de mudança de cidade (moro em Curitiba) e a bateria de avalizações e exames para o ingresso na fila deram-se de modo relativamente fácil. A equipe que me atende é altamente competente e iluminada. Com a presença de Deus em nossas vidas reunimos todas as pedras que apareceram no caminho e com elas contruímos nosso castelo de proteção.

Não me sinto mais sozinha, desamparada ou descrente.

A doença continuou avançando, e logo após o meu 26º. aniversário fui internada no INCOR, aonde cheguei passando muito mal. A falta de ar e o cansaço eram tão grandes que nem falar eu conseguia mais!

A insuficiência cardíaca é uma doença que maltrata muito o paciente. Tinha fome, mas não conseguia comer porque cansava. Aquilo que eu conseguia ingerir era colocado para fora em seguida. Atividades como banho, pentear o cabelo e escovar os dentes tornaram-se esgotantes maratonas, e não consigo mais executá-las sozinha.

Somente quem tem ou já teve insuficiência cardíaca entende o grau desse cansaço. É algo inexplicável.

O transplante é a cura de minha doença e minha única opção. Estou no hospital desde o dia 26 de abril, e apesar de estar na fila em prioridade, por conta da gravidade do caso, é triste saber que o número de doações de órgãos caiu drasticamente.

A doação de órgãos ocorre somente quando é constatada a morte encefálica, através de uma rigorosa avaliação médica. São necessários empenho e dedicação de inúmeros profissionais, e a doação somente se concretiza mediante a autorização da família do doador.

A recusa familiar acontece em 30% dos casos, número elevado que, aliado aos demais problemas da área de saúde em nosso país, faz com que milhares de pessoas aguardem muito tempo por um órgão e, em muitas ocasiões, venham a falecer.

A possibilidade de um homem comum retirar um órgão de alguém falecido e transplantá-lo em uma pessoa doente, e esse transplante representar a cura e o retorno a uma vida normal, é um milagre de Deus.

O ato de doar órgãos é um ato de amor ao próximo.

Sei que não é fácil dizer “eu sou um doador”, mas sabendo que só a vida Eterna dura para sempre devemos pedir coragem ao Pai, e juntos conseguiremos vencer o que humanamente parece ser impossível. Qualquer um de nós pode vir a precisar de um transplante de órgão, até mesmo você!

Pai, peço-te que sensibilizes o coração de cada ser humano, para que não seja apegado ao corpo material. Sobretudo porque pode ajudar na sobrevivência do irmão que se encontra ao lado.



ANA CAROLINA MOREIRA ZARPELLON